Que fale o nobre tribuno! – gritaram os senadores, e aqui e ali o coro era zombeteiro.
Diodoro levantou-se, escura e aquilina figura em sua túnica militar, o elmo emplumado e a armadura com a espada curta e larga pendente do cinto. Levantou sua mão revestida de malha, e os senadores, alguns desdenhosos, outros sorridentes, alguns velhos, outros jovens, alguns patrícios, outros desprezíveis libertos sem honorabilidade, ficaram em silêncio, olhando para o tribuno. A luz do sol deslizava pelos ombros vestidos de branco, e aqui e ali um rosto nobre recortava-se em claridade sombria, ou um lábio se iluminava, ou um olho faiscava, ou fazia-se de fogo, ou um perfil mesquinho se revelava no recorte do seu contorno, como o desenho tosco de uma criança. O piso de mármore e as paredes reluziam , as colunas fulguravam, e soldados de espadas desembainhadas perfilavam-se às portas de bronze das entradas.
Diodoro olhou para eles todos e um pressentimento estranho e poderoso desceu sobre ele. Aquilo apenas aumentou a crescente força da ira do seu coração, sua repulsa, sua sensação de que as soldaduras de seu corpo lutavam contra a paixão de sua alma que desejava explodir. Caminhou para o podium e, no silêncio, o eco de suas sandálias revestidas de ferro soou de parede a parede, de coluna a coluna, e a luz do sol relanceou pelo seu elmo e pela sua armadura, em súbita fulguração. Ele era Marte, abroquelado e belicoso, armado com o raio, e envolvido em alta grandiosidade.
Descansou as mãos no rebordo da estante e olhou para os senadores. Sorriu, não agradavelmente, mas tomado de raiva.
Vós, romanos, amigos e compatriotas, ouvistes-me antes deste dia. Falo hoje em nome de Roma, pela última vez. Depois, silenciarei.
Aspirou o ar, profundamente, e seu peito se dilatou tomado pela paixão e força:
Não vim honrar Roma, mas enterrá-la.
Uma voz gritou:
Traição.
Diodoro tornou a sorrir, e curvou a cabeça.
É sempre traição falar a verdade.
Ergueu a cabeça e fixou os senadores com o faiscar poderoso de seus olhos.
Neste mesmo Senado, não há muitos anos, um senador foi assassinado por ter falado a verdade. Não pela faca ou pela espada ou pela lança foi ele assassinado, nem pelas pedras honestas. Não foi mão digna a que o atingiu e derrubou, pois não havia aqui mãos dignas. Ele falou de Roma. Gritou que já não era uma República e que se tornara um império sedento de sangue, governado não por homens de sabedoria, não pela lei, mas por Cezar e suas legiões, seus generais e seus libertos rapaces e seus políticos palacianos. O senador ergueu-se neste mesmo podium e chorou pela República. Chorou porque os senadores não era eleitos pelo povo, mas legiões infames e pelas turbas ociosas e ávidas que desejavam apenas devorar os frutos dos celeiros e os tesouros e divertirem-se com charlatães e saltimbancos, atores e cantores, gladiadores e pugilistas... a expensas do público.
“Aquele senador era um jovem de olhos brilhantes e coração como o do touro sagrado, ardoroso de amor pelo seu país. Um jovem brutal que não usava frases polidas e não tinha elegância. Tinha apenas amor pelo seu país. Um jovem apaixonado que acreditava ser a verdade invulnerável e as mentiras frágeis teias de aranha.! Mas, como sabeis, ele apenas amava a sua pátria e só os loucos amam a sua pátria”.
Os senadores conservavam-se em duro, mas tenso silêncio e alguns dos mais velhos baixavam a cabeça lembrando-se de sua vergonha e encolerizavam-se contra o tribuno que trazia tal vergonha à sua lembrança. Os soldados andavam de um lado para o outro, nas portas, lentamente, e ouviam, os seus rostos voltados para Diodoro; alguns eram jovens e patriotas e seus corações batiam apressadamente. (Do livro Médico de Homens e Almas – Taylor Caldwell. Gentileza do Osório Santana Figueiredo, a quem agradeço).
Percebam que desde a Roma antiga era proibido falar e defender a verdade.
Até enquanto a censura não me cortar, novamente.
terça-feira, 9 de agosto de 2011
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Fiz esta pesquisa sobre o tribuno Diodoro, exatamente porque estou lendo o livro "medico de homens e de almas" e estou gostando.
ResponderExcluirExcelente livro, mostra a vida de um tribuno que honrou com dignidade a velha Roma contra os seus detratores
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